(por José Affonso)
A ética envolve um impulso para o Bem. É o bem que se deve procurar, é o mal que se deve evitar, é o bem que deve estar presente na finalidade de todas as ações humanas; é o bem não pode estar ausente dos meios utilizados para atingir tais fins, e assim por diante. Na política, o bem recebe o nome de bem comum. É para ele que devem convergir todas as ações e as ações de todos os participantes do jogo político. Aqui, um primeiro grande esquecimento: para que haja ética na política é necessário que haja ética no eleitor, no político e nos partidos políticos. Seria ingenuidade imaginar que conseguiremos a ética como produto adquirido para uso específico no segmento da elite detentora de mandatos e presente nos quadros de governo e administração.
Não teremos grandes avanços enquanto parte expressiva, senão a maioria do eleitorado, votar por bairrismo, paixão clubística, beleza ou simpatia, em troca de camisetas, ranchos ou favores, buscando o bem pessoal próprio através de representação corporativa ou com o olho num emprego ou bolsa de estudo, ou ainda movido por sentimentos menores como o ódio ou o ressentimento. Se o eleitor vota assim, como esperar que a pessoa por ele escolhida vá se conduzir de modo diferente? Se o eleitor busca o próprio bem, como reprovar o político eleito quando este o deixa de lado e vai cuidar de seus próprios interesses? Qual a diferença moral entre a atitude de um e de outro? Quem vende voto por camiseta faz algo melhor do que o parlamentar que vende voto por alguma vantagem pessoal?
Por outro lado, os mais comuns deslizes éticos entre os políticos não estão relacionados com ilícitos penais. Bem mais freqüentes, e raramente reprovados, são os comportamentos daqueles que se elegem dizendo que vão fazer o que depois não fazem ou que não fazem o que se dispuseram a fazer em campanha, que sacrificam convicção pessoal por voto, que disputam posições para as quais se sabem despreparados, que são inoperantes, omissos ou ausentes, que negociam contra o bem comum, que estimulam conflitos, que não querem a paz e nem a constroem.
A sonora questão da fidelidade partidária não é diferente e, mesmo nela, existe uma incongruência ética dos próprios partidos: o companheiro que deixa a sigla é traidor; o adversário que para ela acorre é herói. Por quê? A fidelidade dos eleitos aos partidos pelos quais concorreram é parte da questão da fidelidade: fidelidade do partido ao seu programa e aos compromissos de campanha, fidelidade do partido ao seu filiado, eleitor e militante, fidelidade do partido ao bem comum. Numa perspectiva ética interessa muito mais (até com vistas à fidelidade) que os partidos escolham sempre os melhores, tornem conhecidos e sejam fiéis aos seus programas, busquem o bem comum acima e antes do bem partidário (que vem conseqüência do provimento do bem comum), sejam tão rigorosos com o erro do companheiro quanto o são com o erro do adversário e não lavem as mãos perante os equívocos, deslizes ou delitos cometidos por aqueles que apresentaram ao eleitorado e para os quais pediram votos.
Não devemos esquecer, por fim, que a parte principal da responsabilidade moral não reside em evitar o mal mas deve, principalmente, cuidar para que o bem seja feito. O partido que não procede assim é mero atravessador. (Fonte: Percival Puggina, WWW.Pastoralis.com.br)